Desisti de tudo para criar minha neta. Trabalhei até tarde da noite, sacrifiquei meus sonhos e sempre coloquei a felicidade dela antes da minha.
E como ela me retribuiu? Me expulsando da minha própria casa, como se eu fosse uma relíquia ultrapassada — tudo porque eu não me encaixava na imagem perfeita que ela queria mostrar aos seus seguidores.
Sabe como são os jovens hoje em dia? Colados aos celulares, assistindo a estranhos fazendo dancinhas bobas, dublando e fazendo pegadinhas ridículas. Passam horas rolando a tela e rindo de pessoas que nunca conheceram.
Minha neta Lily é uma delas. Ela filma tudo — seu café da manhã, suas roupas, seus tutoriais de maquiagem — e milhares de pessoas a assistem. Ela é o que chamam de "influencer".
Nunca entendi a obsessão de compartilhar cada momento online, mas mesmo assim a apoiei. Afinal, fui eu quem a criou.
Quando minha filha e meu genro morreram em um acidente de carro, Lily tinha apenas onze anos. Meu mundo desmoronou, mas eu não tinha tempo para lamentar. Eu tinha uma filhinha que precisava de mim.
Abandonei minha aposentadoria tranquila, voltei a trabalhar como costureira, aceitei todos os bicos que pude. Dediquei tudo o que tinha para criá-la.
Eu estava lá para cada joelho ralado, cada pesadelo, cada recital da escola. Fiz o lanche dela, ajudei com a lição de casa, segurei a mão dela quando ela estava com medo.
Quando ela descobriu as mídias sociais, eu a apoiei — mesmo sem entender por que as pessoas precisavam saber o que ela tinha jantado.
Nunca pedi muito. Só respeito. Um pouco de amor.
Mas tudo mudou quando Lily fez 21 anos e experimentou a fama na internet.
Ela começou a me excluir. Parou de me convidar para jantares quando seus amigos influenciadores vinham. Revirava os olhos quando eu fazia perguntas simples. E então, uma noite, eu a ouvi durante uma transmissão ao vivo, rindo com seus seguidores:
— Você não sabe como é difícil viver com a minha avó… Ela ainda acha que hashtag é uma espécie de máquina de waffle!
As amigas dela riram. E eu fiquei paralisada no corredor.
Minha neta — a criança que eu amava mais do que tudo — tinha vergonha de mim.
Aquilo partiu meu coração. Mas a verdadeira traição veio algumas semanas depois.
Certa manhã, ela me sentou com o telefone na mão.
— Vó, acho que está na hora de você se mudar.
– O que?
— Eu te amo, mas meu conteúdo está sofrendo — ela disse, arrastando as palavras como se estivesse fazendo um grande sacrifício. — Meus seguidores acham você deprimente.
Ela virou a tela para mim. Quem é aquela senhora idosa no fundo? Lily, sua estética é perfeita, mas a atmosfera de avó não está funcionando.
Engoli em seco.
— Então você está me expulsando porque alguns estranhos na internet acham que sou muito velho?
Ela suspirou.
— Não é só isso. Meus amigos não se sentem confortáveis em festas aqui. E se eu começar a namorar um influenciador famoso? Você acha que ele vai querer ficar numa casa que cheira a lavanda e naftalina?
Foi então que percebi… que eu tinha criado uma estranha.
Não discuti. Levantei-me, fui para o meu quarto e arrumei minhas coisas em silêncio. Suas palavras ecoavam na minha cabeça como ecos que eu não conseguia silenciar.
Quando saí com minha mala, Lily já tinha o celular no tripé.
— Espere, espere! — ela chamou. — Preciso gravar isso.
— Gravar o quê?
— Um vídeo de despedida! Meus fãs adoram conteúdo emocionante. Vou fazer com que pareça bem dramático, como se eu estivesse me despedindo da minha querida avó. O dia mais difícil da minha vida e tudo mais…
Saí sem dizer mais nada.
Mudei-me para a "comunidade para idosos" que ela havia escolhido. Lily achou que tinha vencido. Que tinha se livrado de mim como se eu fosse um suéter velho que não combinava mais com a marca dela.
Mas ela esqueceu de algo.
A avó dela não era indefesa.
Enquanto ela corria atrás de seguidores e curtidas, eu passei a vida construindo relacionamentos verdadeiros.
Um dos meus antigos clientes era advogado. Outro? Um jornalista com muitos seguidores.
Com a ajuda deles, expus Lily.
A jornalista publicou uma matéria sobre como a suposta queridinha da internet expulsou a própria avó de casa para proteger sua imagem online. A história viralizou.
O artigo incluía capturas de tela de suas transmissões ao vivo zombando de mim, o vídeo falso de despedida chorando e a campanha GoFundMe que ela criou "para ajudar a avó" — da qual ela ficou com cada centavo.
A reação foi imediata. Os patrocinadores a abandonaram. Seu número de seguidores despencou. Os comentários começaram a surgir:
Você usou sua avó para conteúdo? Nojento. Você deveria ter vergonha.
E a melhor parte? O advogado me ajudou a recuperar minha casa.
Acontece que eu tinha provas suficientes para mostrar que Lily me manipulou para assiná-la sob falsos pretextos. Não foi fácil, mas a casa foi devolvida ao meu nome.
Saí daquela chamada comunidade de idosos de cabeça erguida.
E a Lily? Ela desapareceu. Provavelmente dormindo no sofá da casa de uma amiga.
Pensei que esse seria o fim do nosso relacionamento.
Mas uma noite, bateram na minha porta.
Era ela.
Ela não parecia mais a influenciadora confiante. Seu cabelo estava bagunçado, seus olhos vermelhos e inchados.
— Vó… perdi tudo. Ninguém mais me apoia. Não tenho para onde ir. Por favor… sei que não mereço, mas… me dá outra chance?
Fiquei olhando para ela por um longo tempo.
— Lily, você me expulsou como se eu não fosse nada. Você me humilhou por curtidas e influência. E agora que perdeu tudo, espera que eu te receba de volta?
Seus ombros tremeram. Ela abriu a boca para falar, mas eu levantei a mão.
— Se você realmente se arrepende do que fez, prove. Não com palavras. Com ações. Vá em frente e se torne alguém melhor. E talvez, só talvez, esta porta se abra novamente algum dia.
E então fiz algo que nunca pensei que faria com minha própria neta.
Fechei a porta na cara dela.
Ouvi-a soluçar do outro lado.
Mas eu não abri. Não dessa vez.
Alguns dias depois, ela fez algo que eu não esperava.
Ela fez uma transmissão ao vivo. Mas, dessa vez, não foi para chamar atenção.
— Eu menti para todos vocês — ela admitiu. — Eu machuquei a única pessoa que me amou incondicionalmente, só pela fama. Eu não mereço o apoio de vocês. Eu preciso mudar. Então… isso é um adeus. Por enquanto.
Ela encerrou a transmissão ao vivo. Apagou as contas. Desapareceu da internet.
Meses se passaram.
Ouvi de outras pessoas que ela conseguiu um emprego em um pequeno café. Que parou de correr atrás de curtidas e começou a ser voluntária em um centro para idosos.
Sem câmeras. Sem lágrimas falsas. Só trabalho de verdade.
Então um dia, eu a vi.
Ela estava ajudando uma senhora idosa a se sentar numa cadeira, falando com ela gentilmente. Não havia celulares por perto.
Foi real.
E pela primeira vez em muito tempo, vi a menina que criei.
A menina que uma vez fez biscoitos comigo e segurou minha mão quando estava com medo.
E eu chorei.
Mas desta vez…Eram lágrimas de verdade.
Deixe um comentário Cancelar resposta
Seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *
Comentário *
Nome *
E-mail *
Site
Salve meus dados neste navegador para a próxima vez que eu comentar.